O MUNDO NOS CABIA
Autor Alan Minas
Idioma português
Editora Kotter Editorial
ISBN 978-658962422-6
1.ª edição, Setembro 2021
Capa mole com badanas, 240 páginas, 160 x 230 x 20 mm
“É um romance que opera transfigurações oníricas da realidade com surpreendente força, poderia se enquadrar em uma releitura do ‘realismo fantástico’ mas segue em direções mais machadianas e rosianas. Neste livro as imagens estão poeticamente entrelaçadas ao enredo e tudo do nome das personagens até seus discursos e diálogos possui um duplo sentido que futuras releituras certamente irão revelar. Concilia metáfora e humor de um modo equilibrado e insurgente.”
Marcelo Ariel
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— Isso não é jogo de criança, homem. Não demora e essa fábrica volta a funcionar, mas no perigo de ser dentro deles! Os meninos não carecem disso, eles precisam é de chão! De se esparramarem no quintal, se correrem e se sujarem!…
Manoel não importou-se com as turras da mulher, seguiu empolgado vendo os filhos treinarem suas ocupações, na tecitura do futuro.
– Isso é lindo, mulher, veja eles! Todos se cabem aqui, esse é o melhor lugar pra se brincarem de gente, pra se inventarem do que são. A Esperança é nosso quintal…
Temerinda calou-se, com o pensamento à prova de dúvida. Sensibilizou-se com o olhar do marido a transver escombros, com as crianças dialogando com o vazio, negociando com ninguém. Os filhos exerciam seus papéis com afinco, vontade que aos poucos foram emprestando aos olhos da mãe. Temerinda começou a caminhar pelos cômodos desocupados da velha fábrica, e inesperadamente foi surpreendida por funcionários carregando bandeja de café, pastas e amostras de panos. Ouviu o ruído de máquinas de escrever no fim do corredor, onde encontrou duas secretárias fazendo pedidos, preenchendo notas. Elas sorriram para Temerinda, bom dia, que não quis interromper o que faziam, e seguiu a perscrutar outros ambientes. O forte som das máquinas trabalhando no galpão, fez-se mais presente. Ela espiou pela janela e viu dezenas de pessoas agitadas em suas funções. Chegou à última grande sala, onde guardavam amostras da produção, e pôde conferir os tecidos mais delicados, ricamente desenhados. Emprestou um pedaço de pano, enlaçou-o no pescoço como um chale e foi até o marido. Manoel ficou surpreso com a mulher envolta em seu tecido preferido.
— Pra essa estampa, eu dei o nome de Utopia.
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